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10 fevereiro 2015

Migrar, Emigrar, Imigrar. Porquê?



Em todos os tempos migrar sempre foi um impulso natural da humanidade. Assim descobrimos cada um dos continentes e habitamos toda a terra. Até os dias de hoje existe sempre pessoas adeptas de mudanças, seja por curiosidade, por atração pelo desconhecido, seja pra sair da rotina ou por algum motivo de força maior. Migrar, emigrar ou imigrar... não importa pra onde, não importa o motivo estas palavras jamais saíram do dicionário. Mas logo que conhecemos uma pessoa nesta situação bate logo aquela curiosidade: Porquê será que ela imigrou?




Isso mesmo. 

Logo, “porquê você imigrou?”, foi uma das perguntas que mais ouvi desde que saí do Brasil. Nas universidades, nas escolas, em locais de trabalho, por amigos, por desconhecidos, na rua... enfim, aqui e lá. Todos querem saber.

Já respondi de várias maneiras, e minha resposta já mudou algumas vezes. De tanto falar sobre o assunto acabei chegando à conclusão que não precisamos de motivos pra mudar de país ou emigrar para algum outro lugar qualquer. Se observarmos bem, sempre tem gente com motivos melhores que os nossos pra se moverem de onde estão; seja da casa dos pais, da cidade, do estado ou mesmo do país e nem por isso se mudam. Então acredito que os motivos somos nós que criamos pra justificar nossas escolhas. De fato existem motivos trágicos como guerras, terremotos, exílio ou mesmo uma fuga que pode forçar uma mudança. Mas quando a escolha é pessoal o que vale mesmo é o nosso livre arbítrio e coragem! Funciona assim em qualquer circunstância e em qualquer lugar. Sempre teremos motivos para procurar algo melhor! Basta nos deixar guiar por eles.

Nos cursos de francês que frequentei por aqui sempre saía esta clássica: “Porquê você imigrou?” Como eu disse antes, já falei e escrevi sobre este tema várias vezes e acredito que tive tempo suficiente para pensar em todas as possibilidades ou em possivelmente todos os motivos; os meus e os dos outros. Em geral o que mais se ouve, ou seja, os motivos citados pelos imigrantes são; a procura de melhor qualidade de vida seja pessoal ou familiar, um bom emprego em vista, a procura de uma melhor situação financeira ou a vontade de recomeçar noutro lugar. Mas já ouvi coisas como; imigrei para viver longe da minha sogra! 

Achei muito engraçado quando ouvi isso de uma chinesa que estudou comigo. Mas com o tempo fui percebendo que muitos motivos estão realmente ligados as frustrações com as relações profissionais, pessoais ou familiares e as limitações nas liberdades de escolha dentro da família ou na sociedade de origem.

Sim, é verdade! 

As pessoas se sentem mais livres vivendo em outra sociedade. Livres pra decidirem o que querem ser e como querem se comportar. Livres para determinar como educar seus filhos. Livres para fazer uma nova escolha profissional. Livres para se vestir, para se expressar e até para ser totalmente diferentes do que já foram um dia. Vejo esta liberdade como um dos melhores aspectos da imigração. Sem a pressão da sociedade temos tempo para refletir melhor sobre a vida e sobre o que nos faz feliz de verdade, pois nos sentimos livres pra nos descobrir e nos permitir viver como manda nosso coração. 

Conheci pessoas que amadureceram e se transformaram de tal forma que eu diria que se tornaram quase irreconhecíveis. A maioria mudou para melhor! Bem melhor! Mas claro que isso é uma decisão pessoal, morar fora só abre uma porta para facilitar que as transformações aconteçam. E isso é de cada um. Tem gente que faz questão de manter-se imutável, acreditando ser isso uma virtude e trazem comportamentos e reações fundamentadas na sua cultura de origem. Nos casos mais extremos as pessoas se isolam em suas comunidades e fazem os chamados “guetos”. Elas mantém rigorosamente suas tradições e culturas e alguns nem mesmo falam outro idioma que não seja sua língua materna. Vivem num mundo a parte.

Não que manter alguns de nossos costumes não seja bom. Ao contrário, acho essencial e até mesmo vital para muitos de nós que moramos fora. 

Falar nossa língua materna em casa, mostrar coisas da nossa cultura, participar ou se informar das coisas do nosso país pode ser apenas uma riqueza cultural a mais que podemos passar aos nossos filhos, mas que também nos mantém vivos como brasileiros, como integrante das duas nações que somos. Nos faz estar conectados com nossas origens, com o que somos, ou com o que já fomos um dia.

Mas se nos abrirmos também para o novo mundo, as vantagens, a meu ver, serão maiores.

Uma das grandes oportunidades que temos é a de podermos avaliar melhor as coisas. Podemos olhar os problemas de nossa cultura, ou de nosso país, de fora. Podemos comparar por experiência o que funciona melhor num lugar ou em outro. Temos, se assim o quisermos, a possibilidade de ampliar nosso ponto de vista. De aprimorar nossa reflexão. Mas claro que isso não nos torna donos da verdade, ao contrário, nos faz entender que a verdade pode ser muito mais relativa do que imaginávamos. E que cada um tem um ponto de vista de acordo com suas experiências, suas vivências e seus conhecimentos. Estar olhando de fora nem sempre nos faz ter uma opinião melhor do que quem está dentro, só nos dá mais frieza pra analisar. 

Ressalto também, sem dúvida, os benefícios a nível pessoal. Temos oportunidade de fazer grandes mudanças na forma de pensar, de ver o mundo e encarar os problemas. Mudanças estas que podem ser profundas e transformadoras. Que podem, mesmo sem que a pessoa se dê conta, mudar toda sua maneira de viver.

Por isso que em qualquer circunstância e por qualquer período de tempo eu sempre incentivo as grandes viagens. Acho que os benefícios são enormes. Como eu disse antes, tanto a nível pessoal, como na relação com nosso país de origem. Temos, por exemplo, a chance de vê-lo com outros olhos, de dar valor a pequenas coisas, antes insignificantes e até de amar coisas nele que jamais havíamos percebido. Conheço alguns expatriados que são muito mais nacionalistas que a grande maioria que vive no Brasil. Às vezes tudo é uma questão de ponto de vista. E mudar o nosso ângulo pode salvar nosso mundo! Mas existem também os que sempre sonharam em sair do Brasil, que nunca se identificaram com nossa cultura e que ganhar o mundo foi só uma questão de tempo! Para estes a adaptação a uma nova sociedade é fácil e natural. Melhor assim pra eles, ou “Tant mieux pour eux” como diriam aqui.



“Morar no exterior é viver entre a cruz e a espada, entre a razão e o coração.
É ter tudo de melhor que o mundo pode te oferecer e sentir falta das coisas mais banais da sua terra. Eu amo meu país, mas ele ainda se comporta como uma madrasta má, infelizmente...” 
Anderson F. Silva


Depois de cruzar o mundo, vem à questão; e agora?



Foto Keith Regina


Morando no exterior há quase cinco anos esta, posso lhes garantir, é também uma questão muito recorrente. Sempre nos deparamos com pessoas querendo vir, e outras querendo voltar. O fluxo é uma constante e os motivos, sempre justificáveis.

Morar no exterior, no meu caso, ainda não é uma questão totalmente resolvida. Eu me sinto pertencente ao grupo que tenta aproveitar as oportunidades e que se abriu para um mundo novo. Tenho consciência dos benefícios e desvantagens de viver entre dois mundos. Talvez por isso eu ainda me pego vivendo em fase, ora completamente satisfeita com a nova vida, ora saudosa, lembrando de um tempo que talvez não exista mais. Me sinto como dito pelo autor desta frase acima, “entre a cruz e a espada, entre a razão e o coração.” Tenho tudo de melhor que um país rico, desenvolvido e com sólidos princípios humanitários e de igualdade social como os que o Canadá pode me oferecer, mas às vezes sinto falta das coisas mais banais do Brasil. 



Sinto falta de alguns amigos do coração, do cafezinho no final da tarde com direito a se encantar com o pôr de sol ou das conversas animadas com gente fina, elegante e sincera; dos encontros de família e do carinho e apoio que sempre recebo. Sinto falta das montanhas, do cheiro da mata, da água fria da cachoeira, de caminhar de uma praia a outra na expectativa de uma visão surpreendente; das paisagens de tirar o fôlego, vista de cima da montanha ou da varanda da pousada; da simplicidade da vida de algumas cidades do interior por onde eu sempre passeava nos finais de semana...
 


 AH! Eu também amo o Brasil... 



Amo de verdade, só que logo após o devaneio me bate uma tristeza. Lembro-me do quão dura é a vida lá. E não é só na questão política, mas social também. Lembro-me da violência urbana, da ganância e do egoísmo; da cultura vazia, flácida e da mentalidade tacanha fácil de encontrar... Lembro-me que infelizmente “este país que tanto amo ainda se comporta como uma madrasta má...” Que quem garante o seu, pouco se importa com o resto da população e que mentir e tão aceitável quanto o preconceito e a discriminação social. Talvez por isso os vilões da dramaturgia encontrem tantos admiradores, e até uma torcida cativa por lá.



Claro que os países desenvolvidos pra onde normalmente migramos não são perfeitos. Tão pouco o Canadá é perfeito. Aqui também tem preconceito, tem discriminação, tem gente mentirosa, tem corrupção, tem governo que quer impor sacrifícios à população. Tem político que mente pra ganhar as eleições e depois não cumpre as promessas. Tem problemas na economia, tem grandes empresas falindo, tem desemprego, tem cortes de orçamentos importantes na saúde, educação, cultura e tem também muitas greves e muitas lutas... O que faz a diferença é que aqui sentimos segurança e confiança. Confiamos na justiça, confiamos que nossos direitos, garantidos por lei, serão resguardados. Confiamos que os culpados serão punidos e os inocentes serão inocentados. Confiamos que as leis, sejam elas quais forem, vão ser respeitadas. Confiamos que não importa quem você seja você terá os mesmos direitos e deveres de qualquer outro cidadão. Mesmo se for o dono de uma companhia aérea e se for pegar um voo essa pessoa vai ter que entrar na fila, como você que comprou na classe econômica, e ele vai esperar sua vez de embarcar como qualquer outra pessoa. E isso não é exceção, isso é a realidade aqui. Podemos ver em qualquer lugar, seja na fila de um banco, do supermercado, e até nas escolas. Porque aqui é vergonhoso não saber esperar sua vez. É vergonhoso desrespeitar o próximo, furar fila, buzinar no trânsito, não respeitar as regras, gritar, conversar ou ouvir música alta incomodando a vizinhança, mesmo que em lugar público. Aqui também tem moda e para segui-la basta ser gentil e respeitoso.


 

E dentro desta lógica, as manifestações surtem efeito, as reivindicações são ouvidas e negociadas, os casos de corrupção e discriminação são julgados. Os direitos das minorias garantidos. A população é consultada sobre temas de seu interesse. As cidades são devidamente sinalizadas e a população é avisada de problemas sérios com a devida clareza e antecedência. 

Os professores, desde a pequena escola até a universidade, ensinam os alunos a refletir, a buscar informações, a pesquisar e jamais enfiam a matéria goela abaixo como verdade absoluta. Então se cria o hábito de pensar, de questionar, de argumentar e refletir!  Aqui criam-se pessoas autônomas, independentes, com opiniões e modo de vida a serem respeitados. Criam-se cidadãos conscientes e não gente egocêntrica, fútil e deslumbrada, estas são as exceções. Aqui a individualidade é respeitada e opiniões diferentes enriquecem o ponto de vista.

Enfim, as coisas funcionam bem e você pode se sentir seguro pra confiar no país e nas pessoas. Pois o país te apoia, te escuta e resguarda seus direitos e as pessoas sabem viver em sociedade e sabem respeitar umas as outras. Qualquer um que se adapte a isso terá uma vida tranquila...

De fato, o que faz a diferença entre as sociedades da qual faço parte; Brasil-Canadá, é aquilo que cada uma apresenta como regra e não as exceções.

Então como convencer a razão? Só mesmo o coração. E todos sabem que o coração tem razões que a própria razão desconhece, por isso terminar os dias em outro país nem sempre é o destino desejado de muitos imigrantes.


Mas qualquer que seja o final da historia o fato é que migrar para outras regiões e principalmente para outros países pode ser uma experiência muito enriquecedora. Seja por uma temporada, alguns anos, ou pra sempre. A viagem sempre vale a pena! Motivo você não precisa, o que você precisa mesmo é de coragem!


Bon Voyage!..

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